O mundo assiste mais uma vez, entre bombas e escombros, ao teatro sangrento protagonizado por Irã e Israel. De um lado, a teocracia xiita; do outro, um Estado sionista armado até os dentes. Ambos se vendem como defensores de valores sagrados, da tradição, da pátria, da fé.
Mas nenhuma reza parece impedir o disparo dos mísseis que arrancam mães dos filhos e crianças dos colos.
Enquanto os governos bradam em nome de Deus, quem sangra são os civis. E é aqui que mora a hipocrisia: o nome de Deus usado como pretexto para políticas de morte. Onde está a religião que acolhe, que perdoa, que ensina compaixão?
Religiões milenares, textos sagrados, líderes com turbantes ou kipás prometendo paz. Mas a prática é outra. A fé virou escudo ideológico para justificar atrocidades.
Os céus são invocados, mas os mortos seguem enterrados na lama da política armamentista. Entre um versículo e outro, lança-se um drone. Entre um discurso moralista e outro, explode-se uma escola, uma ambulância, um prédio residencial.
E o mundo, já anestesiado, continua contando os corpos como estatísticas, jamais como vidas. Se há algo sagrado nesse conflito, definitivamente não é a vida humana.
O Irã, com seu moralismo autoritário, controla o corpo das mulheres, silencia dissidentes, e financia milícias como extensão de sua fé institucionalizada. Israel, com sua superioridade bélica, age como se a autodefesa justificasse tudo, inclusive a desumanização de populações inteiras.
Ambos se dizem vítimas, ambos alegam legítima defesa. Mas quem defende os inocentes que morrem no fogo cruzado? Quem protege os jovens assassinados antes de viver? A religião virou só estética: está nas bandeiras, nas vestes, nas orações públicas, mas sumiu do olhar para o outro.
Falar em “valores sagrados” quando se bombardeia um hospital é cuspir nos próprios dogmas. Ambos os Estados seguem usando sua doutrina religiosa para encobrir projetos de poder. A guerra se retroalimenta com discursos de ódio, fanatismo e uma moral seletiva que escolhe quem merece viver. É o fundamentalismo com gravata, a espiritualidade sequestrada por governos e exércitos.
Não se trata mais de fé, mas de dominação. A religião, usada como pretexto, perdeu qualquer traço de amor ao próximo. Ela se institucionalizou como poder, e poder, quando absoluto, corrompe até o que é sagrado.
As vítimas desse conflito não oraram pelo fim. São civis, famílias, estudantes, trabalhadores. São corpos enterrados em massa sem sequer um ritual. E o silêncio das grandes lideranças religiosas do mundo é ensurdecedor.
Onde estão os papas, os aiatolás, os rabinos com coragem de dizer que matar em nome de Deus é blasfêmia? Que o verdadeiro milagre seria um cessar-fogo? O que vemos é a fé rendida aos arsenais, ajoelhada diante de interesses geopolíticos. A religião virou blindagem moral para quem quer manter o controle, e não um caminho para a paz.
Em 2025, talvez já seja hora de admitir: há mais humanidade em um ateu solidário do que em um general devoto. Se Deus existe, ele não está em Teerã nem em Tel Aviv.
Está nos olhos da criança que chora com medo, da mulher que grita por justiça, do jovem que morre sem saber por quê. Porque nenhuma fé verdadeira manda matar. Nenhuma moral decente despeja mísseis em berçários. O nome disso não é religião. É guerra travestida de santidade.